Decifrada a árvore genealógica da Via Láctea
Enxame globular Messier 107 Crédito: ESO |
Uma equipe internacional de investigadores liderada pelo Dr. Diederik Kruijssen do Centro para Astronomia da Universidade de Heidelberg e pelo Dr. Joel Pfeffer de da Universidade John Moores em Liverpool conseguiu agora inferir a história das fusões da Via Láctea e reconstruir a sua árvore genealógica, usando apenas os seus enxames globulares.
Para conseguir isto, desenvolveram algumas simulações avançadas de computador da formação de galáxias semelhantes à Via Láctea. As suas simulações, de nome E-MOSAICS, são únicas porque incluem um modelo completo para a formação, evolução e destruição dos enxames globulares.
Nas simulações, os cientistas conseguiram relacionar as idades, composições químicas e movimentos orbitais dos enxames globulares com as propriedades das galáxias progenitoras nas quais se formaram, há mais de 10 bilhões. Ao aplicarem estas informações a grupos de enxames globulares na Via Láctea, puderam não somente determinar quantas estrelas estas galáxias progenitoras continham, mas também quando se fundiram com a Via Láctea.
"O principal desafio de ligar as propriedades dos enxames globulares à história da fusão da sua galáxia-mãe sempre foi que a 'montagem' galáctica é um processo extremamente confuso, durante o qual as órbitas dos enxames globulares são completamente reorganizadas," explica Kruijssen.
"Para entender o complexo sistema que resta hoje, decidimos, portanto, usar a inteligência artificial. Treinámos uma rede neuronal artificial nas simulações E-MOSAICS para relacionar as propriedades dos enxames globulares com a história das fusões da galáxia hospedeira. Testámos o algoritmo dezenas de milhares de vezes nas simulações e ficámos surpresos com a precisão com que foi capaz de reconstruir as histórias das fusões das galáxias simuladas, usando apenas as suas populações de enxames globulares."
Inspirados por este sucesso, os investigadores propuseram-se a decifrar a história das fusões da Via Láctea. Para tal, usaram grupos de enxames globulares que se pensa terem sido formados na mesma galáxia progenitora com base no seu movimento orbital. Ao aplicar a rede neuronal a estes grupos de enxames globulares, os cientistas não só puderam prever as massas estelares e tempos de fusão das galáxias progenitoras com alta precisão, como também revelar uma colisão até então desconhecida entre a Via Láctea e uma galáxia enigmática, que os investigadores denominaram "Kraken".
"A colisão com Kraken deve ter sido a fusão mais significativa que a Via Láctea já sofreu," acrescenta Kruijssen. "Antes, pensava-se que uma colisão com a galáxia Gaia-Encélado-Salsicha, ocorrida há cerca de 9 bilhões de anos, era o maior evento de colisão.
No entanto, a fusão com Kraken teve lugar há 11 bilhões de anos, quando a Via Láctea era quatro vezes menos massiva. Como resultado, a colisão com Kraken deve ter realmente transformado a aparência da Via Láctea na época."
Juntas, estas descobertas permitiram que a equipe de investigadores reconstruísse a primeira árvore completa das fusões da nossa Galáxia. Ao longo da sua história, a Via Láctea canibalizou cerca de cinco galáxias com mais de 100 milhões de estrelas e cerca de quinze com pelo menos 10 milhões de estrelas. As galáxias progenitoras mais massivas colidiram com a Via Láctea há 6 a 11 bilhões de anos.
Os cientistas esperam que as suas previsões estimulem estudos futuros para pesquisar os remanescentes destas galáxias progenitoras. "Os detritos de mais de cinco galáxias progenitoras foram agora identificados. Com os telescópios atuais e futuros, deverá ser possível encontrá-los todos," conclui Kruijssen.
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